A criação de uma embalagem de Coca-Cola mais alta, porém mais fina, está fazendo o cliente pagar o mesmo valor de antes por menos bebida. É que o novo formato tem apenas 310ml, 40ml a menos que as tradicionais com 350ml, mas está sendo vendido a comerciantes pelo preço antigo. E o custo disso tem sido repassado ao consumidor.
— Falei para o vendedor (do refrigerante): “Vem cá, essa latinha com menos quantidade tem o mesmo preço da outra?”, e ele disse que sim. Aí tivemos que manter o preço de venda em R$ 5 também — conta Paulo César, vendedor do Esquina da Lapa.
A estratégia de passar a vender um produto em menor quantidade é adotada frequentemente por empresas. Em mercados, o EXTRA encontrou outros itens que passaram por encolhimento e dão o aviso nas embalagens — cumprindo uma portaria do Ministério da Justiça.
— O que acontece é que a empresa tenta fazer com que o produto final permaneça numa faixa de preço acessível no orçamento de crise. Normalmente, diminui a quantidade do produto e continua com o preço. Na prática, é um aumento, pois o consumidor paga mais e leva menos. Mas muitos desavisados não percebem — diz Gilberto Braga, professor de Finanças do Ibmec.
Segundo a Coca-Cola Andina, que fabrica a bebida no Rio, não houve redução de embalagem, o que desobriga o aviso. A marca afirma que a lata de 310ml, chamada de Slim, disponível nos sabores tradicional e zero, “é um novo produto, e foi desenvolvida para atender à demanda dos consumidores por embalagens menores e porções individuais” e que “a lata de 350ml continua como produto regular do portfólio”. Mas Régis Lopes, gerente do bar Os Ximenes, nega a oferta da latinha maior: — Só vendem essa de 310ml agora. O EXTRA ouviu comerciantes de cinco estabelecimentos, e todos afirmam que as latas de 310ml, chamadas de Slim, estão sendo vendidas a eles pelo valor das de 350ml, que já não são mais oferecidas.
Tem cliente que nem nota
A Coca-Cola Andina diz que a lata de 350ml estava com o “preço médio parado desde dezembro de 2015” e teve “insumos reajustados”. Ou seja: aumentou o preço, porém, segundo comerciantes, sumiu do catálogo.
Em quase um mês de vendas, nenhum cliente de Paulo César ou Régis Lopes mostrou ter percebido que a nova latinha tem menos 40ml da bebida, ou seja, cerca de 11% de redução.
Entre os mais atentos, porém, a medida da Coca-Cola já foi motivo de queixas. Sérgio Valente, dono de duas unidades do restaurante Bom Grill, na Cidade Nova, relata:
— Quem vai sofrer é o comerciante, pois o cliente vai pensar que foi uma decisão dele comprar a menor e cobrar o mesmo preço. A Coca-Cola jogou a bomba, e a gente tem que segurar.
Segundo Antonio Carlos Morim, coordenador da Pós-Graduação de Gestão e Marketing da ESPM-Rio, ainda não é possível saber se a embalagem antiga deverá acabar a longo prazo:
— A Coca-Cola deve observar as estruturas de consumo. Se o consumo da de 310ml aumentar e o da outra declinar, reduz a produção de uma e aumenta a da outra. O próprio modelo produtivo e o consumo se ajustam.
Como deve ser o informe
Quando há efetivamente uma substituição de embalagem, o Ministério da Justiça obriga que as empresas informem as reduções nos pacotes, por, no mínimo, três meses. Todos os itens encolhidos que foram constatados pelo EXTRA em supermercados seguem a orientação.
— O consumidor precisa ficar atento para não levar menos coisa do que pretendia, porque, ao reduzirem os volumes, as marcas mantêm o mesmo preço ou aumentam. Essa mudança não é ilegal, desde que essa redução seja informada com destaque e de forma clara, na própria embalagem, para não induzir o consumidor ao erro — diz Sérgio Tannuri, advogado especialista em Defesa do Consumidor.
Caso contrário, a empresa que “maquiar o produto” pode ser denunciada nos órgãos de defesa do consumidor e multada. Mesmo com a regra cumprida, o presidente do Procon Carioca, Jorge Braz, afirma que o consumidor pode se posicionar:
— Se a regra é cumprida, mas o consumidor se sente prejudicado com a redução da quantidade, ele deve procurar outra marca. A empresa não existe sem o cliente.
Leia as notas na íntegra
Sobre a Coca-Cola
“A lata de 310 ml é um novo produto e foi desenvolvida para atender a demanda dos nossos consumidores por embalagens menores e porções individuais. Mesmo com a chegada desta nova embalagem, a lata de 350 ml continua como produto regular do nosso portfólio e pode ser adquirida por qualquer ponto de venda, inclusive restaurantes.Não há nenhuma restrição comercialização deste produto. Atualmente, vendemos a lata de 350 ml para cerca de 83% dos restaurantes que compram conosco. Com preço médio parado desde dezembro de 2015 e com insumos reajustados, a lata de 350 ml teve uma atualização em seu valor neste mês de junho de 2017.”
Sobre a batata Ruffles Churrasco
“A PepsiCo, fabricante da marca RUFFLES® , possui um portfólio bastante dinâmico. Ao longo dos últimos anos, as embalagens de suas marcas passaram por uma séria de alterações para se adequarem às necessidades dos consumidores e do mercado. É importante ressaltar que o portfólio, como um todo, busca atender diversas ocasiões de consumo, seja em casa, reunido com a família, o que pede uma embalagem maior, ou durante o lanche da tarde, para um consumo individual. Por esta razão, a marca hoje conta com 7 tipos de gramagens diferentes, que vão de 17g a 400g.”
Sobre a barra de chocolate Nestlé Crunch
“A Nestlé informa que a alteração na gramatura dos tabletes de chocolate Nestlé tamanho família segue uma tendência global de mercado que se traduz na comercialização de produtos alimentícios em menor quantidade por embalagem, visando estimular hábitos de consumo cada vez mais equilibrados, dentro do conceito de porcionamento. A mudança para quatro porções exatas foi realizada para atender esta tendência, procurando adaptar a oferta não só ao perfil das pessoas, mas também ao tipo de lar do consumidor. É importante destacar que a Nestlé atende rigorosamente todas as exigências legais aplicáveis à rotulagem e embalagem de alimentos, em especial no que se refere à informação de alteração da quantidade de seus produtos. Quando há redução de gramatura, a empresa respeita integralmente a legislação que regula esse tema, mantendo a respectiva comunicação na embalagem pelo período por ela estipulado.”
Sobre a caixa Lacta Grandes Sucessos
“Com relação à redução da caixa Lacta Grandes Sucessos, de 332g para 302g, ocorrida em 2016 tivemos uma alteração no mix de produtos, com base em comentários de consumidores que pediram pela volta de sucessos como os chocolates Laka e Diamante Negro. A readequação do peso final é resultado dos maiores custos de commodities dos novos produtos, que têm sido um desafio em toda a indústria há algum tempo. É importante lembrar que o preço final repassado ao consumidor varia de acordo com a política de preços de cada varejista.”