Europeus tiram suco de laranja da mesa e brasileiros pagam o pato

Enquanto o consumo de suco de laranja cai na Europa, principal comprador do produto brasileiro, citricultores tentam reagir

Entre 75% e 85% das laranjas produzidas no principal parque cítrico do Brasil, o cinturão São Paulo-Minas Gerais, vira suco, segundo levantamento da Fundecitrus

03/06/2017 | 12h09 | Giorgio Dal Molin

O brasileiro não tem o hábito de tomar [muito] suco de laranja: são 15 litros por ano, contra 22 na média do europeu e do norte-americano. Mesmo assim, o país é o maior produtor do mundo do gênero e 97% da produção é exportada. Nos últimos anos, contudo, uma mudança de hábitos na Europa vem prejudicando os produtores cítricos: a queda no consumo.

“O suco de laranja vem perdendo espaço para outras bebidas na Europa, como a água de coco e sucos especiais. No Reino Unido, o consumo de suco de laranja caiu 100 milhões de litros entre 2012 e 2015”, informa Luís Gustavo Budziak, economista da Valuup, consultoria e assessoria econômico-financeira.

Uma consequência direta é o “aprodrecimento” das exportações de laranjas nos últimos anos. Em 2015 foram de 1,1 milhão de quilos exportados da fruta. No ano seguinte, apenas 157 mil quilos.

Os estoques de suco de laranja dos associados da Associação Nacional dos Exportadores de Sucos Cítricos (CitrusBR) no Brasil também vêm caindo. Em agosto de 2013, eram 550 mil toneladas em poder dos associados. Em 2014 e 2015, pouco mais de 335 mil. Já em 2016, 162 mil : o menor volume de suco estocado desde a temporada 2010/2011, segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada, da Esalq/USP.
Safra “azeda” e concorrência “desleal”

As condições climáticas também não foram das mais favoráveis durante a produção da última safra, encerrada em abril. Resultado: o parque citrícola de São Paulo e Minas Gerais (o principal do Brasil) produziu 18% a menos – 245 milhões de caixas contra 300 milhões da safra anterior, segundo o Fundo de Defesa da Citricultura (Fundecitros). O resultado foi o pior em quase 30 anos – desde a safra 1989/90 os resultados não eram tão ruins.

A próxima colheita não deve ser tão ruim, segundo análise do coordenador de pesquisa de estimativa de safra da Fundecitrus, Vinicius Trombin. Porém, o citricultor tem outro problema para enfrentar: a concorrência de outras frutas que viram suco. “A queda no consumo de suco de laranja na Europa tem muito a ver com a entrada de novos sabores e novas bebidas no mercado”, admite.

Ele explica que a fruta sofreu ‘ataques midiáticos’ que prejudicaram o consumo. “Algumas comunicações denegriram o produto dizendo que era muito calórico, obviamente com interesses por trás disso”, afirma.

Como a Europa é forte produtora de frutas vermelhas, como a cereja, quando preço está baixo para esses produtos, são feitas campanhas para vender sucos desse gênero rapidamente, explica Trombin. “O varejista quer colocar a venda hoje para vender amanhã”, diz. Também aconteceu o aumento dos chamados “sucos detox” e o aumento dos lanches rápidos, deixando de lado as compras de caixas de suco de laranja. “Hoje a pessoa passa na lanchonete e pega um pote de café e vai trabalhar”, emenda Budziak.
ArquivoCom mercado espremido na Europa, produtores tentam motivar o consumo de suco de laranja com publicidade Contra ataque laranja

Para reverter a situação, os brasileiros estão partindo para o “contragolpe”. “Nosso setor está se organizando para fazer uma comunicação promocional do suco na Europa para estancar a queda do consumo. Junto com envasadores e exportadores, os produtores e processadores de suco do Brasil se uniram para financiar campanhas na Europa. É uma inovação no setor agrícola”, conta o coordenador do Fundecitrus.

A ideia é mostrar os benefícios para a saúde, além do sabor agradável. E a ideia precisa dar certo: a Europa é o principal comprador do suco de laranja brasileiro, com cerca de 70% das aquisições – seguido pelos Estados Unidos (18%), Japão e China (cerca de 3% cada). Não seria, então, o caso de investir mais no mercado interno?

“Seria uma forma de reverter o quadro. Outra maneira seria buscar outros mercados consumidores, como a América Latina, China e outros países que pudessem desenvolver esse mercado”, recomenda o economista da Valuup.

Talvez seguindo essas recomendações o Brasil pare de colocar tantas laranjas em uma mesma cesta.

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