Hemobrás investiu R$ 820 milhões em estabelecimento
Proposta do ministro da Saúde para criação de consórcio responsável pela produção de hemoderivados no Brasil implicaria numa mudança no mercado de sangue do País
Lígia Formenti, O Estado de S. Paulo
12 Junho 2017 | 03h00
A proposta do ministro da Saúde, Ricardo Barros, para a criação de um consórcio responsável pela produção de hemoderivados no Brasil implicaria numa mudança radical do conturbado – e milionário – mercado de sangue do País. A Hemobrás, estatal criada pelo governo em 2004 para explorar a atividade, iniciou em 2010 a construção de uma fábrica em Goiana (PE). Desde então, R$ 820 milhões foram desembolsados, duas inaugurações realizadas e nenhum hemoderivado produzido. Nesses anos, foram várias as denúncias de corrupção, superfaturamento e erros envolvendo os projetos de construção do complexo.
Inicialmente, o projeto previa apenas a produção de hemoderivados com base no fracionamento do plasma. Um acordo foi firmado com a empresa francesa LFB para transferência de tecnologia de produção. Pelo trato, o plasma brasileiro era enviado para a empresa francesa, que se encarregava de processá-lo e enviá-lo para o País. Problemas na qualidade dos serviços da empresa estrangeira interromperam a estratégia. O processamento foi suspenso e uma alternativa para a transferência de tecnologia está em avaliação.
Há cinco anos, a Hemobrás firmou outra parceria, com a empresa Shire, desta vez para a produção do fator VIII recombinante. O prazo para a transferência de tecnologia era de dez anos. Antes da transferência, a Shire vendia o produto ao País.
Do acordo, porém, a única parte cumprida foi a compra do fator VIII. Só o projeto para a adaptação da fábrica foi concluído. A obra mal começou. “Os investimentos não foram feitos. Além disso, a Hemobrás reduziu as compras de hemoderivados da Shire por orientação do ministério, descumprindo o acordo”, informou o procurador do MP junto ao TCU, Marinus Marsico. Para completar, o contrato de compra de hemoderivados recombinantes da Shire não previa variação cambial. “Com aumento do dólar, o valor da unidade do fator VIII em reais subiu. O ministério não reajustou o repasse e a Hemobrás arcou com o prejuízo”, disse o presidente da estatal, Oswaldo Castilho.
Pelos cálculos do MP junto ao TCU, o valor necessário para completar a obra de readaptação da Hemobrás, com a Shire, equivale a quatro meses de importação de medicamentos recombinantes. “Será que vale a pena desperdiçar todo esse trabalho?”, questiona Marsico. Barros afirma não haver verba.
A Secretaria de Saúde de São Paulo também tem reservas sobre a estratégia do ministério. “Temos uma fábrica de hemoderivados pronta, equipada, magnífica, aguardando apenas um parceiro para iniciarmos a produção”, afirma o secretário David Uip, que diz ser delicado formar um consórcio com base em três estruturas com estágios de produção tão distintos.
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