Justiça Federal nega recurso e mantém liminar que obriga União a comprar remédio alemão para leucemia
Decisão continua determinando que Ministério da Saúde importe o produto solicitado pelo Centro Boldrini, autor do pedido. União trocou a importação do medicamento no início do ano; especialistas criticam falta de eficácia.
Por G1 Campinas e região
17/07/2017 17h40
O Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª Região negou o recurso do Ministério da Saúde e manteve a liminar concedida em maio pela Justiça de Campinas (SP) ao Centro Boldrini. A decisão determinava que a União importasse a asparaginase alemã, medicamento usado no combate a Leucemia Linfóide Aguda (LLA) e que foi trocado pelo governo federal no início do ano, mediante solicitação do hospital ou de qualquer outra unidade que faça o tratamento da doença pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Com a negação do recurso, assinada pelo desembargador federal Johnson Di Salvo na sexta-feira (14) e divulgada nesta segunda (17), continua determinado que o Ministério da Saúde importe os frascos da asparaginase alemã para o Boldrini a partir de setembro. De acordo com especialistas e testes realizados, a Leuginase, comprada pela União no início do ano, não tem comprovação de eficácia e por isso não pode ser usado em crianças, faixa etária mais afetada pela LLA.
“A compra é estranha, porque o Ministério da Saúde trocou um medicamento que vinha sendo comprado há muitos anos por uma droga – usada apenas em Honduras e no Peru – que é vendida por meio de locais em cujos endereços existem apenas escritórios de contabilidade, conforme foi constatado por diligência realizada pela Polícia Federal”, concluiu o magistrado no texto da decisão.
A oncologista e presidente do Boldrini, Sílvia Brandalise, que se recusou a usar o medicamento chinês e importou, por conta própria, 500 frascos da asparaginase alemã, comemorou a decisão da Justiça Federal. “Seguimos firmes na luta por um medicamento que tenha segurança e eficácia comprovadas. Os pacientes do Boldrini não serão tratados com um medicamento sem tais comprovações e o mesmo deveria valer para todos os hospitais brasileiros”, afirmou, em nota.
Nova licitação
No dia 10 de julho, o Ministério da Saúde informou que vai seguir recomendação do Ministério Público Federal (MPF) e abrirá uma nova licitação para a compra do medicamento. No entanto, segundo a União, "entre os produtos com as mesmas qualificações", será utilizado o critério do menor preço. Ou seja, o remédio chinês (Leuginase) pode ser comprado novamente se oferecer valor mais barato na concorrência.
A presidente do Boldrini revelou preocupação com a nova licitação que será aberta pelo governo federal. "Medicina não é balcão de negócio. Utilizar o critério do menor preço é muito delicado porque é a criança brasileira que será prejudicada. Eles [o governo federal] falarem em mesmas qualificações já é um avanço, mas se eles usarem o mesmo processo da Leuginase, o medicamento comprado também pode não ter comprovação de eficácia", explicou.
Em junho, o hospital de Campinas recebeu os 500 frascos da asparaginase alemã, que era usada anteriormente antes do Ministério da Saúde trocar a importação. O Boldrini decidiu importar os frascos por conta para garantir o tratamento das crianças.
Os lotes devem durar até setembro. Depois disso, a presidente vai importar outras amostras do produto para garantir a manutenção do estoque, caso o Ministério da Saúde não cumpra a determinação da Justiça de importar os frascos para o hospital. A multa em caso de descumprimento é de de R$ 50 mil.
De acordo com especialistas, cerca de quatro mil crianças precisam de um componente chamado asparagina, que tira o alimento das células malignas da LLA. Até o início deste ano, o Ministério da Saúde importava a Asparaginase de laboratórios alemães e americanos, cuja eficiência é de 90% e possui apenas três impurezas, segundo testes. No entanto, o impasse começou quando, no início deste ano, a pasta decidiu comprar o remédio do fabricante chinês.
Testes
A presidente do Boldrini ainda afirmou que encomendou um novo teste no medicamento chinês, feito pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). O exame apontou que a ação da asparaginase alemã é três vezes maior que a da Leuginase. Antes, outros três testes já haviam apresentado impurezas no produto, além de inibir os efeitos de antibióticos.
Em maio, o G1 consultou um especialista para entender as principais diferenças entre os dois medicamentos. Entenda os problemas apontados.
O que diz o Ministério da Saúde
O Ministério da Saúde disse, em nota oficial nesta segunda-feira (17), que o Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS) atestou a qualidade da Leuginase e não encontrou contaminantes bacterianos que podem causar danos ao paciente. Além disso, a pasta informou que ainda não foi notificada oficialmente da decisão do TRF, mas está à disposição para esclarecimentos. Confira o restante do texto enviado pela União:
A pasta ainda esclarece que a orientação para a compra da L-Asparaginase continua a mesma. Entre produtos com as mesmas qualificações, será adquirido o de menor preço, exatamente como foi feito na oferta da Leuginase".
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