Maçã transgênica, que não escurece, invade a salada de frutas

Primeira variedade de maçã transgênica que resiste à oxidação começa a ser vendida nos Estados Unidos neste mês. Produtor espera impulsionar consumo da fruta, estagnado há 20 anos

A salada de frutas geneticamente modificada chegou à mesa dos consumidores. Depois do mamão papaia resistente a vírus, agora é a maçã transgênica que começa a ganhar espaço nas quitandas.

Neste início de novembro, a primeira safra comercial de variedade transgênica de maçã verde (do tipo Golden Delicious) está sendo despachada dos pomares de Washington para cerca de 400 frutarias do Meio-Oeste americano. Elas serão vendidas fatiadas, prontas para o consumo, em pacotes de 300 gramas e, por serem modificadas geneticamente, demoram muito mais para escurecer quando expostas ao ar.

Se por um lado os transgênicos respondem por grande parte da safra de grãos norte-americana – como milho e soja –, esse não é o caso das frutas. Kevin Folta, professor de horticultura da Universidade da Flórida, lembra que há pouco incentivo comercial para pesquisar e cultivar frutas transgênicas devido aos custos de mudanças na legislação alimentar, e também pelo risco de rejeição dos consumidores. O mamão papaia do Havaí, desenvolvido para resistir a um vírus letal, era até agora o único fruto transgênico presente nos supermercados.

Não há evidência de que alimentos modificados geneticamente causem qualquer problema à saúde, mas a tecnologia ainda desperta polêmicas, com alguns consumidores dispostos a pagar mais caro por alimentos produzidos de forma convencional.

A marca de frutas Okanagan, da Colúmbia Britânica, no entanto, aposta que a conveniência de uma maçã que não escurece rapidamente após ser cortada vencerá a resistência dos consumidores. A empresa acaba de colher 50 toneladas das maçãs “árticas” – apelido dado à variedade modificada geneticamente. É o suficiente para atender a demanda por dois meses, avalia o presidente da companhia, Neal Carter.

Carter acredita que o frescor e a resistência prolongada das maçãs terão um apelo especial a pais que vivem muito ocupados, obtendo inclusive um preço melhor no mercado. “Qualquer que seja a opinião das pessoas sobre a transgenia e sobre nossas maçãs árticas, o fato é que ninguém contesta que aumentar o consumo de frutas e vegetais frescos é uma escolha saudável”, aponta Peter Hirst, professor de horticultura da Universidade de Purdue, em West Lafayette, no estado de Indiana.

“Se essa tecnologia levar mais gente a colocar maçãs fatiadas no lanchinho das crianças, já é uma ótima coisa”, diz Hirst. Maçãs transgênicas, em particular, podem ser uma aposta arriscada. As maçãs são vistas como a quintessência do que representa um alimento saudável para os filhos. “Estamos falando de um mercado muito sensível” – lembra Jim McFerson, professor de horticultura da Universidade Estadual de Washington. Segundo McFerson, alguns agricultores do Noroeste, a maior região produtora de maçã dos Estados Unidos, entendem que introduzir a maçã transgênica no mercado traz o risco de macular a imagem positiva do fruto na mente dos consumidores.

Enquanto morangos são simplesmente morangos para a maioria dos consumidores, as maçãs se apresentam em inúmeras variedades, e muitas alcançam preços “premium”, como a variedade Honeycrisp (similar à Fuji).

A maçã transgênica está em gestação há vários anos. Neal Carter e a esposa, Louisa, fundaram a empresa Okanagan em 1996 e desde 2003 começaram os experimentos com a variedade ártica. O Departamento de Agricultura dos Estados Unidos regulamentou o produto em 2015. A variedade transgênica é obtida eliminando-se o gene que libera a enzima que oxida a maçã. A maior parte das lavouras transgênicas gera aumento de produtividade, ao melhorar o controle de pragas e plantas daninhas. Mas Hirst acredita que alimentos desenvolvidos com características que apelam ao consumidor – como maior concentração de vitaminas – podem conquistar a preferência das pessoas.

Nos Estados Unidos, alimentos com manipulação genética não precisam ser rotulados, então as maçãs árticas serão vendidas sem o selo de transgênico. A informação sobre como a fruta foi produzida estará disponível por meio de QR Code, no site da empresa e também por um serviço 0800.

O consumo de maçã nos EUA mantém-se estagnado há 20 anos, num contexto de aumento dos índices de obesidade, o que faz a empresa Okanagan apostar na aparência da variedade ártica para dar novo impulso à demanda. Atualmente, cerca de 115 hectares de maçãs árticas estão cultivados no estado de Washington, incluindo opções para os tipos Golden Delicious, Granny Smith e Fuji. Neal Carter planeja expandir o cultivo para mais de 400 hectares até 2020. A empresa pretende, ainda, levar o plantio para o Canadá e outros países.

A maçã transgênica foi testada junto aos consumidores no início do ano, em pesquisas de mercado em seis cidades. Agora, pela primeira vez, chegará às frutarias e supermercados. Dos que experimentaram, mais de 90% disseram que comprariam a fruta, caso a encontrassem à venda.

“O objetivo das maçãs árticas é promover a alimentação saudável, incrementar o consumo da fruta e reduzir o desperdício dos alimentos, independentemente de renda ou qualquer outro fator”, assegura Carter.
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