TJ-SP obriga plano de saúde a pagar remédio fora da lista da Anvisa
3 de janeiro de 2018, 14h02
Por Brenno Grillo
Por entender que há risco à vida de um homem com câncer de estômago, o desembargador José Luiz Mônaco da Silva, do Tribunal de Justiça de São Paulo, obrigou, liminarmente, um plano de saúde a custear remédio não previsto na lista da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) pelos próximos 90 dias. Na decisão, que reformou cautelar de primeiro grau, o magistrado estipulou multa diária de R$ 1 mil em caso de descumprimento.
“O estado situação de saúde do agravante é tão grave que está internado na UTI […] Assim, presentes os requisitos legais, notadamente a probabilidade do direito invocado, defiro os efeitos da tutela recursal pleiteada para que a ré, em 5 dias, custeie o tratamento prescrito com o medicamento ‘Keytruda’”, disse o desembargador na liminar.
O homem moveu a ação contra o plano depois de ser diagnosticado com câncer de estômago, em 2015. Por conta do rápido desenvolvimento da doença, o médico que o atende lhe receitou o medicamento Keytruda, que não é previsto na lista da Anvisa, mas já é usado em estudos no exterior.
O plano de saúde se negou a custear o tratamento alegando que seria preciso o aval de uma junta médica. Mas esse procedimento também não é coberto pelo convênio. Segundo o advogado do autor da ação, Simon Zveiter, o paciente não tem condições de arcar esse tipo de consulta colegiada, porque tem pago do próprio bolso o medicamento, que custa R$ 20 mil a dose — que deve ser administrada a cada três semanas.
Na sentença, o juízo da 8ª Vara Cível de São Paulo negou o pedido do autor justamente pela falta de previsão do medicamento na lista da Anvisa: “Indefiro a tutela, posto que o medicamento indicado pelo médico não é reconhecido pela Anvisa, sendo descabida o custeio de medicamento cuja comercialização pende de autorização”.
Home care
Depois de conseguir o custeamento do remédio, o paciente obteve autorização médica para continuar o tratamento em casa, pois está debilitado e há risco de infecção hospitalar. Até o momento o plano de saúde não respondeu à solicitação de custeio do chamado “home care”.
“A ré claramente não tem interesse no cuidado de seus beneficiários, o autor teve alta, mas com atendimento de homecare, face a situação extremamente delicada, ocorre que faz quase uma semana que tal pedido fora realizado e até a presente data não fora liberado diversos pedidos foram feitos”, afirmou Zveiter no aditamento apresentado ao juízo.
Jurisprudência definida
Há inúmeras decisões permitindo o custeio de remédios fora da lista da Anvisa por planos de saúde. Uma delas, do Superior Tribunal de Justiça, proferida em 2016, determina que o plano de saúde, mesmo havendo cláusula contratual limitando o direito do consumidor, não pode excluir do custeio medicamento prescrito por médico responsável pelo tratamento do beneficiário.
Segundo o STJ, a abusividade dessa conduta existe mesmo que o tratamento seja ministrado em ambiente domiciliar. “Se o contrato prevê a cobertura de determinada doença, é abusiva a cláusula que exclui o tratamento, medicamento ou procedimentos necessários à preservação ou recuperação da saúde ou da vida do contratante”, disse o relator do caso, ministro Marco Aurélio Bellizze, relator do caso.
Em 2015, o TJ-SP fez uso de entendimento similar para definir que é conduta abusiva do plano de saúde negar o fornecimento de medicamentos para tratamento de quimioterapia prescritos por médico. Em outra decisão, também do tribunal paulista, mas de 2014, foi determinado que o convênio médico que assume a obrigação de prestar assistência à saúde de um cliente deve fornecer o remédio, mesmo que o Ministério da Saúde proíba o fornecimento de medicamentos sem registro na Anvisa.
Em sentença de 2013, proferida pelo juiz Daniel Ovalle da Silva Souza, que ocupava à época a titularidade da 8ª Vara Cível do Fórum Central de São Paulo (mesma que analisa o caso noticiado), definiu que o plano de saúde não pode se negar a pagar por medicamentos, estejam eles previstos ou não no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
"Em sede de direitos do consumidor e de contratos de adesão, a interpretação das cláusulas deve ser feita de modo mais favorável ao consumidor, sem prejuízo, ainda, do uso do princípio da razoabilidade. Assim, havendo previsão no contrato de que serão prestados aos usuários do plano serviços médicos, auxiliares e hospitalares, além de tratamentos na medida em que sejam necessários para o controle da evolução da doença e elucidação diagnóstica (artigo 12, inciso II, alínea d, da Lei nº 9.656/98), temos que a utilização do medicamento Lucentis não pode ser obstada", disse o juiz em sua decisão.
Brenno Grillo é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 3 de janeiro de 2018, 14h02
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