Falta medicação no pós-transplante
Publicado 16/10/2017 – 21h30 – Atualizado 16/10/2017 – 21h33
Por Inaê Miranda
Um câncer de fígado levou o engenheiro agrônomo Giulio Cesare Stancato, de 62 anos, a passar por um transplante há exatos cinco anos. Foram três anos na fila até conseguir a doação do órgão. O procedimento pago pelo Estado custou cerca de R$ 80 mil.
Desde então, o pesquisador faz uso de duas medicações imunossupressoras — Tacrolimo e Micofenolato de Sódio — que ajudam evitar que o fígado transplantado sofra rejeição. O problema é que as medicações estão em falta desde agosto nas farmácias de alto custo e Stancato e os demais pacientes sem os remédios temem pelas consequências da sua falta. A Secretaria de Estado, porém, responsabiliza o governo federal pela falta da medicação.
O remédio é retirado uma vez por mês e, a cada três meses, em média, os pacientes precisam fazer exame de sangue e passar por consulta para então conseguir a autorização para retirar o medicamento. “O remédio é retirado uma vez por mês. De agosto para cá não tem tido o remédio. A gente vai lá e pega a medicação para dez dias. Depois tem que voltar três vezes no mês porque não está tendo. Na última semana de setembro, fui lá no último dia útil do mês e não consegui pegar o remédio”, relatou o pesquisador.
Satancato faz uso de 60 comprimidos de uma das medicações e 240 de outra por mês. Na última sexta-feira, ele tinha estoque em casa para apenas oito dias. “Está diminuindo dia após dia”, afirma.
A sua última consulta médica foi no dia 10 de outubro e ele conta que o problema é tão sério que os médicos mal conseguem orientar os pacientes. “Falei com o médico sobre a falta de remédio. Eles não sabem nem orientar sobre o que fazer nesses casos. Falam que vai vir. O médico me falou que parecia que tinha regularizado e a moça da farmácia disse que não e que não tinha previsão para chegar. A hora que acabar não sei o que faço”, disse.
A medicação não é vendida em drogarias comuns e mesmo se estivesse, pouquíssimos pacientes teriam condições de acesso já que são de alto custo. O preço do Tracolimo, por exemplo, varia de R$ 497,29 a R$ 2.104,78, dependendo da dosagem, composição e apresentação. Já o Micofenolato de sódio pode ser encontrado por R$ 1.199,00 e ou R$ 2.314,00 de acordo com a dosagem. “Está fora do meu orçamento se eu tiver que comprar”, diz. O pesquisador afirma que a consequência, caso fique sem a medicação, é a rejeição do órgão. “Fiquei três anos na fila de transplante fazendo quimioterapia para os tumores não crescerem e agora, por negligência, pode vir tudo por água abaixo. Avalio essa situação como o caos. Um descaso. E o medo é isso se torne uma constante”, diz. Stancato também estuda entrar com uma ação para conseguir a medicação via judicial. “É duro precisar de um remédio que a tua vida depende dele.”
A Coordenadoria de Assistência Farmacêutica informou que a compra e distribuição do medicamento Tacrolimo aos estados cabe ao Ministério da Saúde (MS). O órgão federal, no entanto, tem enviado irregularmente o produto na dosagem 1 mg a São Paulo, desde o início de 2017, descumprindo os prazos previstos em portaria federal e entregando quantitativos parciais. “A defasagem acelera o esgotamento do estoque e obriga o Estado a fazer remanejamentos para evitar interrupções nos tratamentos, fundamentais para a manutenção dos órgãos transplantados”, diz em nota.
Solicitação
Para atender os pacientes no quarto trimestre, a pasta disse que solicitou 8,2 milhões de comprimidos. O MS aprovou somente 6,2 milhões e, até o momento, entregou 33% do quantitativo. Já no trimestre passado, dos 6,2 milhões de comprimidos aprovados pelo órgão federal, São Paulo recebeu apenas 56%. “A pasta estadual tem cobrado rotineiramente a União e aguarda pelo menos uma perspectiva de regularização”, informa a nota.
O Ministério da Saúde também é responsável pela compra e distribuição das duas dosagens do Micofenolato de Sódio (180mg e 306mg). Para atender os pacientes no quarto trimestre, a pasta solicitou 4,4 milhões de comprimidos de 360mg. O Ministério da Saúde aprovou 3,2 milhões e, até o momento, entregou 33% desse quantitativo. Já na dosagem de 180mg, a pasta solicitou 316 mil comprimidos; o Ministério aprovou 224 mil e entregou somente 22% desse quantitativo. O Ministério da Saúde foi procurado, mas não retornou à reportagem até o fechamento desta edição.
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