Justiça pede recolhimento de remédio oferecido pelo SUS sem eficácia comprovada
O Ministério da Saúde disse que "está à disposição das autoridades para informar sobre o processo de compra, realizado em conformidade com a legislação"
Por Weruska Goeking 13 jul, 2017 11h03
SÃO PAULO – O MPF/SP (Ministério Público Federal de São Paulo) entrou com ação para que a União recolha imediatamente o medicamento LeugiNase, distribuído a hospitais do SUS (Sistema Único de Saúde) para o tratamento de leucemia linfoide aguda.
Segundo o MPF, a medicação, de origem chinesa, foi adquirida sem licitação embora não haja nenhuma comprovação sobre sua eficácia científica e segurança sanitária. “O LeugiNase foi comprado pelo Ministério da Saúde em substituição ao medicamento japonês/alemão Aginasa, que já era utilizado pelo SUS desde 2013, com resultados positivos de até 90% de cura”, conta o MPF.
Tanto o LeugiNase quanto o Aginasa são nomes comerciais de uma medicação essencial no tratamento da leucemia linfoide aguda – um dos tipos de câncer mais comuns em crianças e adolescentes, com cerca de 4 mil novos casos por ano no Brasil.
O medicamento correto, junto com outras quatro drogas, tem taxas de cura entre 70% e 90%. No entanto, quando um dos componentes da quimioterapia é falho, esse índice cai para menos de 50%, conta o MPF, destacando que a falta de eficácia do LeugiNase ameaça a vida de milhares de crianças.
Segundo testes realizados pelo LNBio (Laboratório Nacional de Biociências) e pelo laboratório norte-americano MSBioworks, o remédio chinês contém grau elevado de impurezas, apresentando 41 proteínas contaminantes contra seis de seu concorrente japonês/alemão.
Também foram identificadas irregularidades na bula do LeugiNase e ausência de literatura técnico-científica sobre ele. Além disso, o medicamento não possui registro na Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).
O órgão regulador, apesar de ter autorizado a importação excepcional, afirmou que não dispõe das informações técnicas necessárias para emitir parecer conclusivo sobre o produto. De acordo com o Ministério da Saúde, o remédio chinês possui registro sanitário em Honduras, Peru, Índia, Uruguai e na própria China.
Problemas na licitação
O MPF também afirma que o processo de aquisição dos medicamentos, realizado em 2016, foi marcado por “inúmeras irregularidades”. Na ocasião, o Ministério da Saúde dispensou a licitação, argumentando se tratar de uma compra emergencial.
No entanto, o MPF alega que a pasta tivera 17 meses para normalizar o abastecimento da medicação e foi “negligente ao não realizar procedimento licitatório regular”.
As irregularidades envolvidas na compra do remédio chinês são objeto de inquérito da Polícia Federal, envolvendo a empresa uruguaia Xetley, responsável pela distribuição do produto no Brasil.
Segundo as investigações, a fornecedora não possui estrutura física em Montevidéu e, no Brasil, seu representante está instalado num pequeno e precário escritório de contabilidade em Barueri (SP). Além disso, a empresa não possui funcionários cadastrados.
Para a procuradora da República Daniela Gozzo de Oliveira, autora da ação, tais constatações reforçam a insegurança relacionada ao medicamento. “Caso ocorram problemas ou danos, como reações adversas e até a morte de pacientes, o consumidor brasileiro não terá a quem recorrer”.
Outro lado
O Ministério da Saúde informou que a orientação para a compra da medicação continua a mesma. “Entre produtos com as mesmas qualificações será adquirido o de menor preço, exatamente como foi feito na oferta da Leuginase”, afirma.
O Ministério disse ainda que já respondeu ao MPF e “está à disposição das autoridades para informar sobre o processo de compra, realizado em conformidade com a legislação”.
A pasta afirma ainda que a medicação tem atividade enzimática comprovada por seis diferentes laboratórios, entre eles o Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS). “A análise ainda mostrou que não foram encontrados contaminantes bacterianos que podem causar danos ao usuário”, explica.
Deixe uma resposta
Quer participar da discussão?Fique a vontade para contribuir!