Nayane Taniguchi (Fiocruz Brasília)
A criação de uma rede de informação sobre a ocorrência de casos de criptococose nos serviços de saúde do DF, a partir do estabelecimento da Rede Criptococose no Brasil (RCB) no DF e na Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno (Ride/DF), possibilitou o levantamento de dados que revelam a ocorrência da criptococose na região do DF e entorno. “Estabelecemos um sistema de vigilância no qual conseguimos saber como funciona e como se comporta a criptococose no Distrito Federal, que era algo totalmente desconhecido até então”, destaca o coordenador do Programa de Epidemiologia em Saúde (PEPIVS) da Fiocruz Brasília, Vitor Laerte, colaborador da Rede de Criptococose Brasil no Distrito Federal (RCB-DF).
Em um levantamento realizado a partir do monitoramento dos casos de criptococose diagnosticados entre 2000 e 2012 na Rede SUS DF, foram identificados 56 pacientes com a micose. De acordo com o Laerte, o número não indica uma alta incidência da doença, mas esta é considerada de alta gravidade. Do total, 56,3% são oriundos do DF, 32,1 % da Ride/DF, e 14,3% de outros estados. O estudo revela ainda que 69,6% dos diagnosticados são do sexo masculino e 30,4% do feminino.
“Não se tinha ciência do que acontecia com a criptococose aqui no DF”, afirma o pesquisador. Segundo Vitor, são notificados entre 30 e 35 casos por ano nessa região. “No Brasil, a letalidade pelos dois agentes de criptococose [Cryptococcus neoformans (Cn) e Cryptococcus gattii (Cg)] ainda é inaceitavelmente elevada, de 45% a 65% em casos de meningite, seja associada ou não à Aids”, afirma o pesquisador. A criptococose é uma micose causada pelas leveduras capsuladas Cryptococcus neoformans (Cn) e Cryptococcus gattii (Cg). A primeira tem caráter predominantemente oportunista, causando cerca de um milhão de casos de meningoencefalite por ano em pacientes com Aids em todo mundo, com aproximadamente 625 mil óbitos. Já a segunda – Cg – pode atingir qualquer pessoa, entre eles crianças, adolescentes, adultos jovens e idosos.
Em relação ao DF, o levantamento indicou letalidade geral da criptococose de 51,8%, sendo de 53,5 % para o Cn e de 40 % para o Cg. “O DF, que é uma das Unidades da Federação mais ricas do país ainda tem níveis africanos de letalidade da criptococose quando comparados aos dos Estados Unidos, que é em torno de 20% a 30%. A realização de um estudo piloto no DF e sua Ride demonstrou que a criptococose tem um prognóstico reservado, sendo que mais da metade dos pacientes morrem pela micose”, avalia Vitor, que acrescenta: “outro achado importante foi a constatação de elevada proporção de pacientes soronegativos. Infelizmente não foi possível identificar a espécie causadora em todos os casos. Este achado é inédito e comprova o desconhecimento da epidemiologia da micose na região estudada”. Dos 56 pacientes registrados, 38 apresentaram sorologia positiva para o HIV, 15 pacientes eram soronegativos e em 3 o resultado não era conhecido.
Segundo o pesquisador, outros dados importantes levantados pelo estudo são a falta de uniformidade no tratamento e a dificuldade em se organizar uma rede de referenciamento e contrarreferenciamento para a abordagem clínica, o que pode ter contribuído para a elevada letalidade. Para Laerte, faltam estudos epidemiológicos sistematizados sobre a criptococose no Brasil e no DF, cujo diagnóstico geralmente é realizado tardiamente.
O estudo contou com a participação de pesquisadores da Universidade de Brasília (UnB), Universidade Católica de Brasília (UCB), da Secretaria de Saúde do DF e do Laboratório de Micologia do Instituto Nacional de Infectologia (INI/Fiocruz), além dos pesquisadores da Fiocruz Brasília.
Rede de Criptococose Brasil no Distrito Federal (RCB-DF)
Constituída em Brasília no final de 2013, a Rede integra, além de pesquisadores da Fiocruz Brasília, representantes da Secretaria de Estado de Saúde do DF, por meio do Laboratório de Micologia Médica do Laboratório Central de Saúde Pública (Lacen-DF), da Universidade de Brasília (UnB) e da Universidade Católica de Brasília (UCB).
Além da realização de estudos retrospectivos, Vitor ressalta ainda, como resultados da criação da Rede na Capital Federal, a execução de projetos de pesquisa para profissionais da Rede SUS DF em nível de mestrado e doutorado. “A implantação da RCB no DF tem por objetivo criar um sistema de vigilância da criptococose e estudar o seu perfil epidemiológico e a evolução clínica dos casos da forma primária e oportunista no DF e Ride/DF, identificando fatores de risco associados aos diversos desfechos clínicos e viabilizando a construção de subprojetos para estudá-los”, explica Vitor.
O grupo faz o acompanhamento da ocorrência de casos de criptococose no DF, a partir dos resultados de laboratório do Lacen-DF, possibilitando saber quantos pacientes estão com criptococose, fazer trabalhos prospectivos e colher informações clínicas e epidemiológicas no DF. Em setembro de 2017, a RCB-DF apresentou resultados de suas pesquisas no Congresso Brasileiro de Infectologia, realizado em setembro deste ano no Rio de Janeiro.
No Brasil, a RCB foi constituída em 2011, na Fiocruz (RJ), e atualmente conta com a adesão de profissionais de saúde e pesquisadores de universidades, institutos de pesquisa, hospitais e laboratórios de saúde pública de 21 estados, entre eles Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Goiás, Mato Grosso do Sul, Bahia, Ceará, Piauí, Minas Gerais, Roraima e DF.
Criptococose
A criptococose é uma micose emergente e cosmopolita, causada pelas leveduras capsuladas Cryptococcus neoformans (Cn) e Cryptococcus gattii (Cg). A primeira tem caráter predominante oportunista, causando cerca de um milhão de casos de meningoencefalite por ano em pacientes com Aids em todo mundo, com aproximadamente 625.000 óbitos. Já a segunda – Cg – é agente de micose sistêmica em indivíduos aparentemente normais, com casos endêmicos nas regiões Norte e Nordeste do Brasil, incluído o semiárido, atingindo crianças, adolescentes e adultos jovens, HIV-negativos.
De elevada letalidade e morbidade, a criptococose tem início com uma infecção pulmonar que pode progredir para uma meningoencefalite. Segundo dados da Rede no DF, em todo o mundo, são notificados, a cada ano, entre 200 e 300 mil novos casos da doença, com cerca de 180 mil óbitos. O pesquisador da Fiocruz Brasília afirma que, por ser uma infecção grave e de diagnóstico demorado, há risco de os pacientes terem sequelas neurológicas e motoras, por exemplo.
A Fiocruz Brasília foi a instituição que idealizou a introdução da RCB na Capital Federal, visto que os pesquisadores da instituição já desenvolviam trabalhos com o Laboratório Nacional de Referência em Micose do Instituto Nacional de Infectologia da Fiocruz do Rio de Janeiro, coordenador nacional da RCB. A rede no DF foi estabelecida em 2013, juntamente com parcerias com a Secretaria de Estado de Saúde do DF, especialmente com o laboratório de Micologia Médica do Laboratório Central de Saúde Pública (Lacen-DF), a Universidade de Brasília (UnB) e a Universidade Católica de Brasília (UCB).
Na AFN