Setor “imune” à crise econômica

Entre fevereiro de 2016 e janeiro de 2017, o mercado farmacêutico movimentou R$ 88 bilhões – cifra que corresponde a quase 80% do gasto total com saúde no país, considerando o piso de investimentos na saúde (R$ 115,3 bilhões) da Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2017. É como se cada brasileiro gastasse R$ 424,33 com a compra de medicamentos por ano. Nos últimos quatro anos, a receita com a venda de remédios no Brasil aumentou 64,5%, e a quantidade de unidades vendidas, 31%, conforme dados da QuintilesIMS, auditoria de mercado farmacêutico.

O setor parece ser imune à crise econômica que faz pipocar pelas cidades as plaquinhas de “aluga-se”. Aliás, muitas das salas comerciais que ficam vagas acabam reabrindo as portas como pontos de vendas de fármacos, especialmente de grandes redes. Presidente da Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias (Abrafarma), Sérgio Mena Barreto afirma que há um movimento de concentração, em que “as grandes estão tomando mercado das pequenas”. Atualmente, as 27 empresas associadas detêm 44% do mercado nacional. Duas décadas atrás, segundo ele, essas redes abocanhavam uma fatia de apenas 20%.

Em Santa Cruz do Sul, no Vale do Rio Pardo, a Drogaria Santa Cruz resiste à pressão da concorrência e destoa desse cenário. Durante muito tempo, o estabelecimento, que tem 83 anos, reinou absoluto. Agora, somente na Rua Marechal Floriano, a principal da cidade, são oito concorrentes. No Estado, é o município com mais de 120 mil habitantes que apresenta o maior número de farmácias por habitante. A relação é de uma loja para cada grupo de 1,6 mil pessoas.

– Fico impressionado – diz Lucas Scalcon, um dos proprietários da Drogaria Santa Cruz, que atende, em média, a 400 pessoas por dia.

Na avaliação do presidente do Sindicato das Indústrias Farmacêuticas do Estado de São Paulo (Sindusfarma), Nelson Mussolini, o aumento das vendas nos últimos anos reflete o crescimento da classe média, o envelhecimento da população e uma busca constante por qualidade de vida. Ele pondera que há um arrefecimento nos últimos anos, sinal de que a crise demorou para bater à porta, mas chegou.

– Já vemos o reflexo do desemprego – avalia Nelson Mussolini. – É uma alavanca que puxa para baixo o desenvolvimento da saúde. Se alguém está com dor de cabeça e está empregado, compra um remédio. Se está desempregado, vai para um quarto escuro e espera a dor passar.

Até 2021, o Brasil deverá ocupar a quinta colocação no ranking mundial do mercado farmacêutico, desbancando França e Itália. Único país do mundo em que é permitida a publicidade direta ao consumidor (com anúncios na televisão, por exemplo), os Estados Unidos lideram, com um faturamento de US$ 461 bilhões.

– Estamos entre cinco países mais populosos, então é normal que estejamos, também, entre os cinco maiores em termos de consumo de medicamentos – justifica o diretor da Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma), Pedro Bernardo.

No Brasil, como a propaganda é mais restrita (é permitido anunciar apenas medicamentos isentos de prescrição), a indústria investe na relação com os médicos e as farmácias. Estima-se que as despesas com a promoção de fármacos (US$ 60 bilhões ao redor do mundo) superam em duas vezes os gastos com pesquisa. Os representantes dos laboratórios são os “propagandistas”, que visitam os médicos para levar informações sobre os produtos. Você já deve ter cruzado com um nas salas de espera dos consultórios: pessoas bem vestidas, puxando maletas geralmente cheias de amostras grátis. Esse investimento está embutido no custo do produto.

– Toda a informação científica sobre o produto tem que ser levada para o médico, que vai avaliar e prescrever. Então, temos que contratar muita gente, e essas pessoas precisam se deslocar. Como é que você pode contratar uma quantidade enorme de gente e absorver esse custo? Não tem como – diz Pedro Bernardo.

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